O Mar da Galileia é um lago de água doce. Ali, nada é só o que aparenta. As colinas emolduram a paisagem. Sobre uma delas, Jesus teria proferido o Sermão da Montanha, uma ode à paz e à justiça. A praia é feita de pedras comuns. Mas algumas delas podem ter sustentado as sandálias de Jesus, durante uma caminhada ao entardecer. E se alguém lança uma rede ao mar? Impossível não lembrar que foi ali, naquelas paragens, que o homem mais influente da humanidade convidou os ribeirinhos para serem "pescadores de homens".
E os peixes? Ainda existem? É possível reviver a emoção de pescar nas águas sobre as quais Cristo teria caminhado? O Mar da Galileia, ao norte de Israel, ao pé das colinas de Golã, já não tem tanto peixe como há dois mil anos. Mas ainda há pescadores. E barcos.
TG visitou o Mar da Galileia, ao Norte de Israel. — Foto: Reprodução TG
Na época da visita do Terra da Gente à Terra Santa, conhecemos Menahem Lev, considerado o melhor pescador. Menahem Lev saiu da Romênia aos 25 anos de idade para pescar. Está na profissão há mais de 30 anos, a bordo do mesmo barco usado que comprou, em 1979. A cabine de controle é uma mistura de ferro-velho e high tech, com bússola e sintonizador de satélites, sonar e telas de computador. E fios por todos os lados. No meio disso, Menahen parece um astronauta russo a bordo de uma sonda Sputnik. Mas é ali que o capitão se sente feliz.
Leva, além da nossa equipe, outros quatro tripulantes, todos de fora: Alon, da África do Sul; Ilan, do Equador; Max e Bernard, dos Estados Unidos. É comum cidadãos do mundo passarem temporadas trabalhando em Israel. Mas, afinal, que peixe vamos pescar? Menahen responde: "O que Deus der".
Menahem Lev é romeno e pesca desde muito jovem — Foto: Reprodução TG
O lago está calmo. Nós, nervosos. A rede é lançada pela primeira vez. São 400 metros de malhas de algodão e fibra sintética, que a fome do mar engole rapidamente. Uma das pontas está presa a um barco auxiliar, também velho e cansado, que fecha o círculo voltando à popa do barcão principal. O guindaste puxa os anéis. Os marinheiros se agitam na lida, mas é o nosso pulso que vai a mil: a rede sobe pesada como um coador e se abre sobre a proa do barco auxiliar como uma bolsa grávida de centenas de filhotes, que se debatem prateados numa profusão de reflexos que embaralham a vista e alegram o coração como diante de um milagre. Não são filhotes, são sardinhas! Encontramos os peixes do Mar da Galileia!
A chegada da rede é o momento mágico do mar, o gol da pescaria. A imagem da rede cheia de peixes de todos os tamanhos nos remete ao famoso mosaico da igreja da multiplicação dos pães e dos peixes, em Tabgha, na costa noroeste do lago, e também à pintura da tapeçaria que cobre as paredes da Capela Sistina, no Vaticano, de Raphael, sobre a pesca milagrosa. Todos se aproximam e só aí percebemos que tem mais. Os peixes maiores – como as carpas comuns, de nove ou dez quilos – chamam atenção primeiro. As primas delas, as carpas prateadas, que se acredita serem originais da China, são as mais cultivadas em aquacultura do mundo.
As daqui foram trazidas do Japão em 1966, para melhorar a qualidade da água. A carpa prateada se alimenta principalmente de algas minúsculas e outros micro-organismos que ela retém da água, por meio de guelras muito finas, em forma de redes e de esponjas. Em outras palavras, os cardumes de carpas funcionam como um sistema natural de filtragem da água. Apesar de exóticas, elas se tornaram indispensáveis aqui, onde a temperatura alta, a pequena circulação da água e a concentração desequilibrada de matéria orgânica favorecem a multiplicação de plâncton.
Diversidade de peixes que o TG encontrou no Mar da Galileia — Foto: Reprodução TG
Por causa desta preocupação, acabamos descobrindo outras curiosidades sobre o Mar da Galileia: é o único mar de água doce abaixo do nível dos oceanos (213 metros), chega à profundidade máxima de 46 metros, mas abaixo dos 30 metros não tem oxigênio.
Em número bem menor, apareceram tainhas, muito parecidas com as que vivem em água salgada, como as famosas do litoral de Santa Catarina, no Brasil. De alguma forma, elas nos trazem um sentimento de familiaridade. Mas nada comparável à quinta espécie de nossa rede. Com os braços fortes que puxaram cordas ao longo de mais da metade da vida, Menahen abre caminho entre os marinheiros, senta-se na borda do barco com o resultado da pesca aos pés e me chama. Levanta um peixe de um palmo de tamanho e enuncia, com voz solene: "This is the fish that Jesus and the apostles used to eat". O "peixe que Jesus e os apóstolos comiam", como ele diz, era uma tilápia. Não era peixe caro, nem grande, nem raro. Mas talvez, ali naquele momento, pensei que pode ter sido o peixe mais especial que já tive nas mãos. Uma simples tilápia, da espécie Oreochromis aureus, feita célebre por uma história.
Um peixe pequeno, batizado com o nome de um gigante: em todo o mundo, a tilápia-azul também é conhecida como Saint Peter, o peixe de São Pedro.
Este foi um dos resultados da nossa pescaria no Mar da Galileia. Mas perto do pôr do sol, quando a luz se apagava sobre a Terra Santa e os pescadores recolhiam as redes para o descanso, pensei num outro que trouxe na bagagem e mudou para sempre a minha forma de ver o mundo: a lição de que, mais importante do que o peixe, o lago e o pescador, são as histórias por trás deles.
Pôr do sol marca o fim da pescaria do TG em Israel — Foto: Reprodução TG
ONDE FICA
Mar da Galileia
O Mar da Galileia fica na fronteira entre Israel e Jordânia. Com 19 quilômetros de extensão tem como principal afluente o rio Jordão, que vem do monte Hermon e de Cesareia de Filipe.
Informações:
Ministério do Turismo de Israel www.infotour.co.il
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